Ameaças à liberdade de expressão em Moçambique
A liberdade de expressão está a ser atacada em Moçambique, segundo informação da Iniciativa de Medição dos Direitos Humanos (HRMI, Human Rights Measurement Initiative), que usa como base relatos de jornalistas dentro e fora do país.
Principais conclusões
- Moçambique recebeu uma classificação de 3,6 em 10 relativamente à protecção da liberdade de opinião e de expressão nos dados de 2018 do HRMI.
- Os outros dois países africanos do projecto piloto do HRMI foram a Libéria, com uma classificação de 7,8 em 10, República Democrática do Cong, com 2,3 em 10, e Angola, com 4,9 em 10.
- Os especialistas identificaram jornalistas e defensores dos direitos humanos como sendo os que correm o maior risco de sofrer restrições na sua liberdade de expressão.
Violência contra jornalistas
Em março deste ano, homens mascarados com armas AK-47 raptaram o proeminente jornalista moçambicano Ericino de Salema. Os homens raptaram-no fora da sede do Sindicato Nacional dos Jornalistas (SNJ) na capital, Maputo, agrediram-no com as armas e por fim, deixaram-no caído e inconsciente numa estrada, com os braços e as pernas partidos.
O Comité de Protecção de Jornalistas (CPJ) pediu uma investigação urgente, dizendo:
Salema é um comentador regular no programa televisivo de actualidades “Pontos de Vista”, que é transmitido no canal privado STV, segundo relatos publicados. Anteriormente, trabalhou na publicação semanal independente Savana, e mais tarde, trabalhou para outros semanários privados, segundo o IOL.
Durante uma transmissão de “Pontos de Vista” em 25 de março, Salema criticou a nova tentativa do governo de reestruturar a dívida de 2 mil milhões de USD de Moçambique incorrida na administração anterior, segundo um relatório no wesbite sul-africano de notícias IOL. Na mesma emissão, Salema também pediu a demissão do Ministro das Finanças Adriano Maleiane.
Em maio de 2016, o académico Jaime Macuane, antecessor de Salema no comentário em “Pontos de Vista”, foi raptado à porta de sua casa, levado a um beco, alvejado em ambas as pernas e deixado à beira da estrada, segundo a AIM.
Desde então, a polícia afirma que está a investigar a ocorrência, mas não foram feitas declarações sobre quaisquer resultados nos seis meses que prosseguiram o ataque. Esta foi a mais recente ocorrência numa onda de ataques a jornalistas e comentadores políticos.
Ameaças financeiras à liberdade de expressão
Em julho de 2018, o governo anunciou novas taxas para a acreditação de jornalistas, que têm sido amplamente criticadas. O Mail & Guardian reportou:
Estas taxas proibitivamente dispendiosas chegaram às manchetes dos jornais e suscitaram repúdio generalizado entre os meios de comunicação. “Os custos elevados envolvidos na acreditação representam um ataque aos meios de comunicação no país”, afirmou a Associação de Correspondentes Estrangeiros da África Subsariana.
“Este aumento das taxas pelo governo moçambicano tornou praticamente impossível para a imprensa independente continuar a trabalhar”, disse o Comité de Protecção de Jornalistas.
O Mail & Guardian afirmou que a combinação destas taxas, a violência continuada contra jornalistas e comentadores políticos e as medidas legais contra jornalistas representavam uma “guerra contra a liberdade de expressão”, algo que se reflecte na informação do HRMI.
O direito à liberdade de expressão e de opinião em Moçambique
Segundo o direito internacional, toda a gente tem “o direito de deter opiniões sem interferências” e o “direito à liberdade de expressão”. Isto inclui “a liberdade de procurar, receber e divulgar informação e ideias de todos os tipos” através de quaisquer meios, incluindo qualquer forma de expressão artística. Este direito também protege uma “imprensa livre, sem censura e sem obstáculos ou outros meios de comunicação” (ICCPR, Parte III, Artigo 19; Comité dos Direitos Humanos, Comentário Geral nº 34, parágrafo 13).
O HRMI inquiriu especialistas em direitos humanos em Moçambique e analisou os resultados. O desempenho de Moçambique em mais de 12 direitos medidos pelo HRMI é apresentado neste gráfico de radar.
Neste diagrama, cada eixo representa um direito. Quanto mais longe do centro do círculo estiver a classificação do país, melhor será o desempenho do país nesse direito humano.
A forma irregular diz-nos que o desempenho de Moçambique é melhor em alguns direitos humanos que noutros. Se um país obtiver uma classificação perfeita, o gráfico será um círculo grande e completo.
A baixa classificação de Moçambique para o HRMI em termos de liberdade de expressão e de opinião está em linha com a opinião de jornalistas de que existem ameaças significativas à liberdade de expressão.
Claramente, Moçambique depara-se com desafios em várias áreas, e a sua baixa classificação junto do HRMI relativamente à liberdade de expressão e de opinião — 5,3 em 10 — está em linha com a impressão dos jornalistas de que existem ameaças significativas à liberdade de expressão.
O site de dados do HRMI também apresenta comparações com vários países. O gráfico abaixo mostra o desempenho dos 13 países do projecto piloto do HRMI em termos de liberdade de expressão.
O gráfico mostra que a protecção do direito à liberdade de expressão e de opinião em Moçambique é semelhante à situação registada em Angola, Brasil, Ilhas Fiji, Quirguistão e México. Moçambique apresenta um desempenho ligeiramente melhor do que o Cazaquistão e Arábia Saudita, mas pior que a Austrália, Libéria, Nepal, Nova Zelândia e Reino Unido.
Moçambique apresenta um desempenho ligeiramente melhor do que o Cazaquistão e Arábia Saudita, mas pior que a Austrália, Libéria, Nepal, Nova Zelândia e Reino Unido.
Quando inquirimos os especialistas em direitos humanos de cada país, perguntámos-lhes que tipos de grupos de pessoas estariam particularmente em risco de sofrer abusos ou restrições aos seus direitos.
Aqui, encontramos uma nuvem de palavras que os grupos de especialistas de Moçambique identificaram como estando em risco, no que toca à liberdade de expressão. Quanto maior a palavra, mais inquiridos a identificaram como sendo um grupo em risco. Novamente, os resultados do HRMI estão em linha com as preocupações dos jornalistas em Moçambique de que são um grupo altamente em risco de sofrer restrições nos seus direitos.
A liberdade de expressão está intimamente ligada à capacidade das pessoas escolherem o seu governo democraticamente. Se a imprensa não puder relatar abertamente o desempenho do governo e as políticas de diferentes partidos e candidatos, as pessoas não poderão tomar uma decisão relevante nas eleições.
O Comité de Protecção dos Jornalistas referiu que o aumento das taxas surge numa altura em que o governo moçambicano procura assinar contractos de exploração de gás natural com empresas multinacionais e terá as eleições municipais em outubro de 2018, enquanto as eleições gerais decorrerão em 2019. O Mail & Guardian escreveu, também que estas eleições surgem numa altura “em que os políticos têm muito medo do poder do jornalismo credível e independente, tornando mais perigoso que nunca produzir este tipo de jornalismo”.
Quem pode usar estes dados?
Todos os dados do HRMI estão disponíveis gratuitamente. Pode explorar o nosso site de dados aqui , e até descarregar os mais recentes.
Temos dados sobre sete direitos civis e políticos e cinco direitos económicos e sociais:
O HRMI pretende produzir dados úteis . Algumas das pessoas que esperamos poderem usar os nossos dados sobre Moçambique, incluem:
- Jornalistas, especialmente os que publicam relatos sobre Moçambique ou a África Subsariana e os que se focam nos direitos humanos, política, problemas sociais ou assuntos internacionais
- Investigadores
- Governos
- Defensores dos direitos humanos
- ONGs
- Monitores de direitos humanos dentro da região e a nível internacional
- Empresas privadas, para a tomada de decisões, para minimizar riscos para investidores e direcionar fluxos de capital eticamente.
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